01 agosto 2023

Código Internacional da Ética Médica


Código Internacional da Ética Médica
[Adotado pela 3.ª Assembleia Geral da Associação Médica Mundial, Londres, Inglaterra, outubro 1949, revisto pela 22.ª Assembleia Médica Mundial, Sydney, Austrália, agosto 1968, pela 35.ª Assembleia Médica Mundial, Veneza, Itália, outubro 1983, pela 57.ª Assembleia Médica Mundial, Pilanesberg, África do Sul, outubro 2006 e pela 76.ª Assembleia Médica Mundial, Berlim, outubro de 2022]

Tradução espontânea sem fins lucrativos do original sito em  
WMA International Code of Medical Ethics

PREÂMBULO

A Associação Médica Mundial (WMA) elaborou o Código Internacional de Ética Médica como um cânone de princípios éticos para os membros da profissão médica em todo o mundo. Em concordância com a Declaração de Genebra da WMA sobre o Juramento do médico e com todo o corpo de políticas da WMA, este código define e elucida os deveres profissionais dos médicos para com os seus doentes, outros médicos e profissionais de saúde, eles próprios e a sociedade como um todo.

O médico deve estar ciente das normas e padrões éticos, legais e regulamentares nacionais aplicáveis, bem como das normas e padrões internacionais relevantes.

Tais normas e padrões não podem reduzir o compromisso do médico com os princípios éticos estabelecidos no presente Código.

O Código Internacional de Ética Médica deve ser lido como um todo e cada um dos seus parágrafos constituintes deve ser aplicado tendo em consideração todos os outros parágrafos relevantes. De acordo com o mandato da WMA, o Código é dirigido aos médicos. A WMA exorta outros profissionais envolvidos em cuidados de saúde a adotarem estes princípios éticos.

PRINCÍPIOS GERAIS

1. O principal dever do médico é promover a saúde e o bem-estar dos doentes individualmente considerados, fornecendo cuidados competentes, atempados e compassivos, de acordo com a boa prática médica e o profissionalismo.

O médico também tem a responsabilidade de contribuir para a saúde e bem-estar das populações que serve e da sociedade como um todo, incluindo as gerações futuras.

O médico deve prestar cuidados com o máximo respeito pela vida e dignidade humanas, bem como pela autonomia e direitos do doente.

2. O médico deve praticar a medicina de forma justa e equitativa e prestar cuidados baseados nas necessidades de saúde do doente, sem preconceitos ou comportamentos discriminatórios baseados na idade, doença ou deficiência, credo, origem étnica, sexo, nacionalidade, filiação política, raça, cultura, orientação sexual, posição social ou qualquer outro fator.

3. O médico deve esforçar-se por utilizar os recursos dos cuidados de saúde de uma forma que maximamente beneficie o doente, de acordo com uma gestão justa, equitativa e prudente dos recursos que lhe são confiados.

4. O médico deve exercer com consciência, honestidade, integridade e responsabilidade, sempre com um entendimento independente e mantendo os mais elevados padrões de conduta profissional.

5. Os médicos não devem permitir que a sua opinião profissional individual seja influenciada por potenciais benefícios para si próprios ou para a sua instituição. O médico deve reconhecer e evitar conflitos de interesses reais ou potenciais. Quando tais conflitos forem inevitáveis, devem ser declarados com antecedência e devidamente geridos.

6. Os médicos devem assumir a responsabilidade pelas suas decisões médicas individuais e não devem alterar os seus juízos médicos profissionais sólidos com base em instruções contrárias às considerações médicas.

7. Quando medicamente apropriado, o médico deve colaborar com outros médicos e profissionais de saúde que estejam envolvidos nos cuidados do doente ou que estejam qualificados para avaliar ou recomendar opções de cuidados. Esta comunicação deve respeitar a confidencialidade do doente e limitar-se à informação necessária.

8. Ao emitir um atestado profissional, o médico só deve certificar o que verificou pessoalmente.

9. O médico deve prestar ajuda em emergências médicas, tendo em conta ao mesmo tempo a sua própria segurança e competência, e a disponibilidade de outras opções viáveis para os cuidados.

10. O médico nunca deve promover ou participar em atos de tortura ou outras práticas e punições cruéis, desumanas ou degradantes.

11. O médico deve empenhar-se na aprendizagem contínua ao longo da vida profissional, a fim de manter e desenvolver os conhecimentos e as competências profissionais.

12. O médico deve esforçar-se por praticar medicina de forma ambientalmente sustentável, com vista a minimizar os riscos ambientais para a saúde das gerações atuais e futuras.

Deveres para com o doente

13. Ao prestar cuidados médicos, o médico deve respeitar a dignidade, a autonomia e os direitos do doente. O médico deve respeitar o direito do doente a aceitar ou recusar livremente os cuidados de saúde, de acordo com os valores e preferências do doente.

14. O médico deve comprometer-se com o primado da saúde e bem-estar do doente e deve prestar cuidados no melhor interesse do doente. Ao fazê-lo, deve esforçar-se por prevenir ou minimizar os danos para o doente e procurar um equilíbrio positivo entre o benefício pretendido para o doente e qualquer dano potencial.

15. O médico deve respeitar o direito do doente a ser informado em cada fase do processo de tratamento. O médico deve obter o consentimento informado voluntário do doente antes de qualquer cuidado médico prestado, assegurando que o doente recebe e compreende a informação necessária para tomar uma decisão independente e informada sobre os cuidados propostos. O médico deve respeitar a decisão do doente de recusar ou retirar o consentimento em qualquer altura e por qualquer razão.

16. Mesmo quando um doente tem a capacidade de decisão substancialmente limitada, subdesenvolvida, prejudicada ou flutuante, o médico deve envolver o doente, na medida do possível, nas decisões médicas. Além disso, o médico deve trabalhar com o representante de confiança do doente, se disponível, para tomar decisões de acordo com as preferências do doente, quando estas são conhecidas ou podem ser razoavelmente inferidas. Quando as preferências do doente não podem ser determinadas, o médico deve tomar decisões no melhor interesse do doente. Todas as decisões devem ser tomadas de acordo com os princípios estabelecidos no presente Código.

17. Em situações de emergência, em que o doente não possa participar na tomada de decisões e nenhum representante esteja disponível, o médico pode iniciar uma intervenção sem consentimento informado prévio, no melhor interesse do doente e com respeito pelas preferências do doente, quando conhecidas.

18. Se o doente recuperar a capacidade de decisão, o médico deve obter o consentimento informado para uma intervenção posterior.

19. O médico deve ser solícito e comunicar, quando disponíveis, com quem seja próximo do doente, de acordo com as preferências e os melhores interesses do doente e com o devido respeito pela confidencialidade do doente.

20. Se qualquer aspeto do cuidado do doente estiver para além da capacidade de um médico, este deve consultar ou encaminhar o doente para outro médico ou profissional de saúde devidamente qualificado que tenha a capacidade necessária.

21. O médico deve assegurar uma documentação médica exata e atualizada.

22. O médico deve respeitar a privacidade e a confidencialidade do doente, mesmo depois de este ter falecido. Um médico pode revelar informações confidenciais se o doente der o seu consentimento informado voluntário ou, em casos excecionais, quando a revelação for necessária para salvaguardar uma obrigação ética significativa e primordial relativamente à qual se tenham esgotado todas as outras soluções possíveis, mesmo quando o doente não der ou não puder dar o seu consentimento. Esta divulgação deve ser limitada à informação mínima necessária, aos destinatários e em duração.

23. Se um médico agir em nome ou por conta de terceiros no que respeita aos cuidados de um doente, o médico deve dar conhecimento disso ao doente no início e, se apropriado, no decurso de quaisquer intervenções. O médico deve revelar ao doente a natureza e extensão desses compromissos e deve obter o consentimento para agir.

24. O médico deve abster-se de publicidade e promoções intrusivas ou inadequadas e assegurar-se de que toda a informação utilizada pelo médico na publicidade e promoção [marketing] é factual e não enganosa.

25. O médico não deve permitir que interesses comerciais, financeiros ou outros interesses conflituantes afetem o seu entendimento profissional.

26. Ao prestar cuidados médicos à distância, o médico deve garantir que esta forma de comunicação é medicamente justificável e que são prestados os cuidados médicos necessários. O médico deve também informar o doente sobre os benefícios e limitações de receber cuidados médicos à distância, obter o consentimento do doente e assegurar que a confidencialidade do doente seja mantida. Sempre que medicamente apropriado, o médico deve procurar prestar cuidados ao doente através de contacto direto e pessoal.

27. O médico deve manter fronteiras profissionais adequadas. O médico nunca deve envolver-se em relações ou comportamentos abusivos, exploratórios ou outros impróprios com um doente e não deve envolver-se numa relação sexual com um doente atual.

28. A fim de prestar cuidados com os mais elevados padrões, os médicos devem cuidar da sua própria saúde, bem-estar e capacidades. Isto inclui a procura de cuidados adequados para garantir que possam exercer com segurança.

29. Este Código centra-se nos deveres éticos do médico. No entanto, em alguns aspetos, existem dilemas morais profundos que os médicos e os doentes podem seriamente considerar conflituantes com as suas crenças conscientes.

O médico tem a obrigação ética de minimizar os incómodos dos cuidados prestados ao doente. A objeção de consciência do médico à prestação de quaisquer intervenções médicas lícitas só pode ser invocada se o doente individual não for prejudicado ou discriminado e se a saúde do doente não for posta em perigo.

O médico deve informar imediata e respeitosamente o doente desta objeção e do direito do doente a consultar outro médico qualificado, bem como fornecer informação suficiente para que o doente possa iniciar tal consulta atempadamente.

Deveres para com outros médicos, profissionais de saúde, estudantes e outro pessoal

30. O médico deve relacionar-se com outros médicos, profissionais de saúde e outro pessoal de uma forma respeitosa e cooperante, sem preconceitos, assédio ou conduta discriminatória. O médico deve também assegurar-se de que os princípios éticos são respeitados quando trabalha em equipa.

31. O médico deve respeitar as relações médico-doente dos colegas e não intervir a menos que seja solicitado por qualquer das partes ou seja necessário para proteger o doente de danos. Isto não deve impedir o médico de recomendar vias de ação alternativas consideradas como sendo do melhor interesse do doente.

32. O médico deve comunicar às autoridades competentes as condições ou circunstâncias que impeçam o médico ou outros profissionais de saúde de prestar cuidados de acordo com os mais elevados padrões ou de defender os princípios deste Código. Isto inclui qualquer forma de abuso ou violência contra médicos e outro pessoal de saúde, condições de trabalho inadequadas ou outras circunstâncias que produzam níveis excessivos e sustentados de tensão.

33. O médico deve ter o devido respeito por professores e estudantes.

Deveres para com a sociedade

34. O médico deve apoiar a prestação de cuidados de saúde justos e equitativos. Isto inclui a abordagem das desigualdades na saúde e nos cuidados, os determinantes dessas desigualdades, bem como as violações dos direitos tanto dos doentes como dos profissionais de saúde.

35. Os médicos desempenham um papel importante em assuntos relacionados com saúde, educação e literacia em saúde. No cumprimento desta responsabilidade, os médicos devem ser prudentes na discussão em ambientes públicos não profissionais, incluindo meios de comunicação social, de novas descobertas, tecnologias ou tratamentos e devem assegurar-se de que as suas próprias declarações são cientificamente exatas e compreensíveis.

Os médicos devem indicar se as suas próprias opiniões são contrárias à informação científica baseada em provas.

36. O médico deve apoiar as investigações científicas médica sólidas em conformidade com a Declaração de Helsínquia da WMA e com a Declaração de Taipé da WMA.

37. O médico deve evitar agir de forma a enfraquecer a confiança do público na profissão médica. Para manter esta confiança, os médicos individuais devem respeitar os mais elevados padrões de conduta profissional e estar preparados para denunciar às autoridades competentes comportamentos que entrem em conflito com os princípios do presente Código.

38. O médico deve partilhar conhecimentos e perícia médica em benefício dos doentes e da melhoria dos cuidados de saúde, bem como da saúde pública e global.

Deveres como membro da profissão médica

39. O médico deve seguir, proteger e promover os princípios éticos do presente Código. O médico deve ajudar a evitar os requisitos éticos, legais, organizacionais ou regulamentares nacionais ou internacionais que prejudiquem qualquer uma das obrigações estabelecidas no presente Código.

40. O médico deve apoiar os colegas médicos no cumprimento das responsabilidades estabelecidas neste Código e tomar medidas para os proteger de influência indevida, abuso, exploração, violência ou opressão.