02 abril 2023

Pareceres do Código de Ética Médica da AMA sobre Médicos no Governo

AMA J Ethics. 2023;25(3):E200-203

Pareceres do Código de Ética Médica da AMA sobre Médicos no Governo
Scott J. Schweikart, JD, MBE ([*])

Tradução espontânea para distribuição sem fins lucrativos do artigo

Resumo: O Código de Ética Médica da Associação Médica Americana (AMA) não se refere especificamente às funções governamentais dos médicos. Este artigo, contudo, resume as orientações do Código de Ética Médica da AMA sobre as interações dos médicos com os governos, bem como os seus papéis não-clínicos, ações e comunicações políticas.

Introdução

Os médicos que desempenham funções governamentais não são raros no mundo profissional de hoje. Por exemplo, muitos médicos servem como autoridades federais ou locais, fazendo leis, elaborando políticas ou trabalhando em agências reguladoras, como a Food and Drug Administration ou os Centros de Controlo e Prevenção de Doenças, onde interpretam, implementam e fazem cumprir ações executivas. Quando os médicos trabalham para o governo, podem surgir questões éticas próprias do seu duplo papel como médicos e funcionários governamentais. O Código de Ética Médica da AMA não se dirige diretamente aos médicos que trabalham em funções governamentais, mas vários pareceres orientam os médicos que atuam como funcionários governamentais ou como agentes ou comunicadores políticos.

Pareceres do Código AMA

Interações com o governo. Um conjunto de pareceres do Código AMA dá orientações sobre autorregulação profissional, designadamente nas secções “Interações Médicas com Agências Governamentais”1; Parecer 9.7.1 - “Depoimento Médico”2; Parecer 9.7.2 - “Tratamento Médico por iniciativa do Tribunal em casos criminais”3; Parecer 9.7.3 - “Pena capital”4; Parecer 9.7.4 - “Participação do médico em interrogatórios”5; e Parecer 9.7.5 - “Tortura”6. Embora não sejam diretamente sobre médicos que também trabalham como funcionários governamentais, estes pareceres estão relacionados e dão uma certa visão sobre questões de política de saúde pública. Por exemplo, o Parecer 9.7.4 afirma: “Os médicos que se dedicam a qualquer atividade que dependa dos seus conhecimentos e competências médicas devem continuar a defender os princípios da ética médica”.5 Assim, os amplos princípios éticos devem orientar as ações ainda que estas não sejam próprias da medicina, mas porque assentam na sua qualificação médica.

Orientação ética para médicos em funções não-clínicas. O Parecer 10.1 - “Orientação Ética para Médicos em Funções Não-Clínicas”7 também se aplica aos médicos que servem em funções governamentais ou cívicas. O parecer afirma: “Mesmo quando desempenham papéis que não envolvem a prestação direta de cuidados a doentes em ambientes clínicos, os médicos são vistos pelos doentes e pelo público, bem como pelos seus colegas e colaboradores, como profissionais que se comprometeram com os valores e normas da Medicina”.7 O Parecer 10.1 refere que os médicos, quando “utilizam conhecimentos e valores adquiridos através da formação e prática médica” nas suas outras funções não-clínicas, continuam a “funcionar dentro da esfera da sua profissão” e, por conseguinte, ainda estão obrigados a defender os principais deveres éticos e de confiança.7 Quando os médicos desempenham funções não-clínicas, podem surgir possíveis conflitos de deveres – digamos, entre as suas funções públicas e privadas – e “podem ter de ser eticamente regulados”, de acordo com o Parecer 10.1, pelos seguintes aspetos:

a. O impacto da função não-clínica na saúde dos indivíduos e comunidades.

b. O grau em que eles [médicos] são entendidos como representantes da profissão médica.

c. O grau em que eles [médicos] confiam na sua formação ou especialização médica para cumprir a função não-clínica.7

Desse modo, os conflitos podem ser menores quando os médicos em funções não-clínicas mantêm as suas normas e valores profissionais, em vez de esquecerem as suas competências e autoridade médica no exercício dessas funções.

Atividade política por parte dos médicos. O Parecer 1.2.10 - “Atividade Política dos Médicos”8 descreve as obrigações éticas dos médicos envolvidos em atividade política. Embora nem todos os médicos com funções governamentais estejam envolvidos em decisões políticas, alguns, como os legisladores, claramente estão. O Parecer 1.2.10 estabelece:

Como todos os americanos, os médicos gozam do direito de defender mudanças na lei e na política, na esfera pública e dentro das suas instituições. De facto, os médicos têm a responsabilidade ética de procurar a mudança quando acreditam que os requisitos da lei ou da política são contrários aos melhores interesses dos doentes. No entanto, têm a responsabilidade de o fazer de forma a não perturbar os cuidados aos doentes.8

Assim sendo, os médicos legisladores devem procurar alterações à lei que acreditam que beneficiarão os doentes e, mais ainda – empenhando-se em qualquer tipo de mudança de política ou advocacia – devem “assegurar que a saúde dos doentes não seja prejudicada e que os cuidados de saúde dos doentes não sejam comprometidos”.8

Comunicações políticas. De relevância para os médicos no governo, especialmente os que ocupam cargos de direção, é o Parecer 2.3.4 - “Comunicações Políticas” que estabelece:

Os médicos gozam dos direitos e privilégios da liberdade de expressão partilhados por todos os americanos. É louvável que os médicos se candidatem a cargos políticos, façam campanha por posições políticas, partidos ou candidatos e exerçam de qualquer outra forma todo o âmbito dos seus direitos políticos como cidadãos. Os médicos podem exercer estes direitos individualmente ou através do envolvimento com sociedades profissionais e comissões de ação política ou outras organizações.9

Além disso, o Parecer 2.3.4 propõe orientações sobre como os médicos podem expressar eticamente os seus pontos de vista políticos. Especificamente, determina que os médicos não devem permitir que “questões políticas interfiram com a prestação de cuidados profissionais” e que os médicos devem ser sensíveis ao “desequilíbrio de poder na relação médico-paciente” sempre que “expressem as suas opiniões políticas pessoais”, especialmente no decurso da prestação de cuidados clínicos aos doentes.

REFERENCES

1.                     AMA Chapter 9: professional self-regulation.

2.                     AMA Opinion 9.7.1: Medical testimony.

3.                     AMA Opinion 9.7.2: Court-initiated medical treatment in criminal cases.

4.                     AMA Opinion 9.7.3: Capital punishment.

5.                     AMA Opinion 9.7.4: Physician participation in interrogation.

6.                     AMA Opinion 9.7.5: Torture.

7.                     AMA Opinion 10.1: Ethics guidance for physicians in nonclinical roles.

8.                     AMA Opinion 1.2.10: Political action by physicians.

9.                     AMA Opinion 2.3.4: Political communications.



([*]) Scott J. Schweikart é analista político sénior na Associação Médica Americana em Chicago, Illinois, onde é também editor jurídico do AMA Journal of Ethics. O Sr. Schweikart obteve o seu MBE na Universidade da Pensilvânia, o seu JD na Case Western Reserve University e o seu BA na Universidade de Washington em St Louis. Tem interesses de investigação em direito da saúde, política de saúde e bioética.