Análise à Opinião Pública sobre Morte Ajudada na Inglaterra
Tradução espontânea do Resumo e Conclusões do relatório
Exploring public views on assisted dying in England
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Resumo executivo
(páginas 7-11)
Em 2023, o Nuffield Council on Bioethics
(NCOB - https://www.nuffieldbioethics.org/) convocou o primeiro Júri
de Cidadãos [Tribunal Cívico] para analisar a opinião pública sobre a eutanásia
na Inglaterra. Este processo revelou que uma clara maioria dos cidadãos está a
favor de uma alteração na lei que permita a eutanásia. Após um extenso
programa deliberativo, baseado em testemunhos de especialistas, defensores
de ambos os lados e pessoas com experiência vivida nas questões, o Júri de
Cidadãos concluiu que a lei deve ser alterada para permitir a morte ajudada
para pessoas com doenças terminais. Não consideraram que a morte ajudada deva
ser permitida em quaisquer outras circunstâncias, por exemplo, em casos de
sofrimento intolerável. Foram unânimes em concluir que, independentemente de a
lei ser alterada para permitir a morte ajudada, deve haver um programa
significativo de investimento e reforma nos cuidados paliativos.
Porquê conhecer a opinião pública em Inglaterra sobre a morte ajudada?
Quando o
NCOB dialogou com especialistas do governo e do setor de políticas de saúde,
ficou claro a todos que seria muito útil ter dados robustos e detalhados sobre
a opinião pública para informar o debate sobre a morte ajudada.
O objetivo deste projeto foi, portanto, obter
provas credíveis e bem fundamentadas sobre a opinião em relação à
morte ajudada na Inglaterra. Isto foi feito com o objetivo de gerar um debate
público informado sobre o assunto e incorporar as conclusões deste debate junto
dos principais decisores políticos, de modo a informar as futuras políticas e
práticas em matéria de morte ajudada.
Que métodos foram utilizados?
Foi utilizado um programa de metodologias
mistas para conhecer a opinião pública sobre a morte ajudada na Inglaterra. No
centro do programa esteve um Júri de Cidadãos, precedido e seguido por dois Inquéritos
representativos a nível nacional.
O que é um Júri de Cidadãos?
Os Júris
de Cidadãos são um método valioso para compreender as opiniões públicas quando:
1. A questão ou área
política envolve questões complexas, incertezas ou crenças e valores
contraditórios.
2. A decisão requer uma
avaliação dos compromissos entre as diferentes opções políticas.
3. Os decisores políticos
não podem elaborar ou executar políticas sem compreender os valores, princípios
e crenças de um público alargado.
As pessoas são recrutadas para os Júris de Cidadãos
de forma a refletirem em linhas gerais a demografia e as atitudes prévias do
público em geral. É-lhes pedido que ouçam e ponderem os dados disponíveis,
deliberem em conjunto, utilizem os seus valores para avaliar alternativas e tomem
decisões, chegando a respostas fundamentadas às questões que lhes são
colocadas. Os dados provêm de testemunhos especializados que foram preparados para
fazer apresentações que proporcionem ao Júri um equilíbrio justo entre as
provas mais relevantes.
Questões-chave e visão geral do processo
As
principais questões colocadas ao Júri foram: 1. A lei
na Inglaterra deveria ser alterada para permitir a morte ajudada?● Quais são as razões
mais importantes a favor da legalização da morte ajudada? ● Quais são as razões
mais importantes contra a permissão da morte ajudada? 2. Se a lei for alterada para permitir a
morte ajudada na Inglaterra, o que deve incluir? O que deve excluir? 3. Se a lei não for alterada para permitir a
morte ajudada na Inglaterra, há alguma recomendação ou alteração que deva ser
feita nas políticas de morte ajudada? O Júri de Cidadãos decorreu durante oito
semanas, entre abril e junho de 2024. Durante um webinar e seis sessões
(quatro online e duas presenciais), os membros do Júri exploraram em profundidade o tema da morte ajudada. Os membros do Júri passaram por um processo de aprendizagem,
deliberação e tomada de decisão em três fases, escalonando as suas
recomendações e elaborando uma declaração dos seus princípios e principais
conclusões.
Este relatório
Este relatório final do projeto apresenta uma
análise qualitativa das conclusões do Júri de Cidadãos, expondo exaustivamente
as suas deliberações. Apresenta as conclusões do Júri juntamente com as de
dois Inquéritos representativos a nível nacional, quando estas acrescentam um
contexto importante. Em geral, isto proporciona uma visão clara do que pensa e
sente uma amostra amplamente representativa da população inglesa sobre o tema
da morte ajudada.
Quais foram as conclusões?
A maioria dos membros do Júri (20 dos 28
membros votantes) e a maioria dos inquiridos (69% dos inquiridos no Inquérito 1
e 70% dos inquiridos no Inquérito 2) concordaram em que a lei em Inglaterra
deveria ser alterada para permitir a morte ajudada.
As três
principais razões apontadas pelos membros do Júri para alterar a lei foram:● Parar a dor● Ter a opção de acabar
com a própria vida ● Saber que
pode morrer com dignidade.
Esses
pontos foram repetidos pelos participantes do Inquérito 2 que apoiam uma
alteração na lei, cujas principais explicações para quererem uma alteração na
lei foram as seguintes:● Uma pessoa com uma
doença terminal ou sem qualidade de vida deve poder decidir sobre a sua morte● As pessoas não deviam
ter de sofrer ● As pessoas devem ter o direito de optar pela
morte ajudada.
Escolha, autonomia e liberdade foram três
conceitos fundamentais que estiveram na base das principais razões apresentadas
pelos membros do Júri para alterar a lei inglesa sobre a morte ajudada. A análise
qualitativa das deliberações do Júri de Cidadãos revelou que as razões mais importantes contra uma alteração da lei identificadas pelo Júri foram:● A preocupação de que as
salvaguardas não sejam suficientemente fortes para proteger os mais vulneráveis
da sociedade contra a coação ou outras formas de pressão para que recorram à
morte ajudada. ● O desvalorizar a vida à
medida que a morte ajudada se torne normalizada. ● Uma constante expansão de
critérios, à medida que as contestações à lei vão esvaziando os critérios
originalmente bem definidos. ● Que os fundos necessários para a criação de
serviços de morte ajudada sejam retirados dos recursos já limitados disponíveis
para cuidados paliativos em fim de vida.
As
salvaguardas foram uma preocupação fundamental para todos os membros do Júri ao
longo do processo, independentemente de concordarem ou não com uma alteração na
lei. Tanto os membros do Júri como os inquiridos no Inquérito 2 afirmaram que
uma preocupação em relação a qualquer alteração na lei era a possibilidade de haver
consequências indesejadas. Por exemplo, os membros do Júri afirmaram que não
querem que a criação de um serviço de morte ajudada em Inglaterra retire fundos
existentes dos cuidados sociais e paliativos.
Os membros do Júri solicitaram o envolvimento
de vários especialistas, incluindo juristas, peritos em assistência social e
psicólogos, para a elaboração de um quadro de salvaguardas prévias à introdução
de qualquer legislação. Se isso acontecer, consideraram que a sociedade teria
mais confiança em que o devido processo teria sido seguido e que as pessoas
vulneráveis seriam efetivamente protegidas.
Critérios para a morte ajudada
Tanto as
conclusões do Júri de Cidadãos como as conclusões do Inquérito revelam apoio a:● Só serem elegíveis para
a morte ajudada pessoas que tenham capacidade mental para tomar as suas próprias
decisões.● Restringir a morte ajudada
a condições terminais. - Os membros do Júri não
chegaram a um consenso sobre um prazo específico para o prognóstico, enquanto
70% dos participantes do Inquérito 2 restringiram esse prazo a um prognóstico de seis meses. ● Excluir a doença mental dos critérios de
elegibilidade para a morte ajudada.
No que
diz respeito às modalidades de morte ajudada, há também um consenso entre o Júri
e os participantes do Inquérito quanto a:● Ambos os modos de morte
ajudada serem permitidos por lei, com profissionais de saúde a poderem
prescrever ou administrar drogas letais destinadas a pôr fim à vida de um
doente a seu pedido voluntário.● Envolvimento dos
profissionais médicos no processo de acesso à morte ajudada. ● As pessoas devem poder escolher onde querem que
a morte ajudada ocorra, permitindo-lhes escolher um local onde se sintam
confortáveis e seguras e possam estar com os seus entes queridos.
Independentemente
de a lei sobre a morte ajudada na Inglaterra ser alterada ou não, os membros do
Júri e os participantes do Inquérito concordam em que é necessário mais
financiamento, prioridade e foco na prestação de cuidados paliativos de alta
qualidade, orientação e assistência emocional a todas as pessoas que se
aproximam do fim da vida ou que cuidam de alguém com um diagnóstico terminal:● Os membros do Júri
manifestaram forte apoio a um aumento do financiamento destinado melhorar a
qualidade e disponibilidade dos cuidados paliativos do Serviço Nacional de
Saúde (SNS).● 97% dos inquiridos no Inquérito 2 pediram um
aumento do financiamento para melhorar a qualidade e a disponibilidade dos
cuidados paliativos do SNS; 81% apelaram à garantia da continuidade dos
cuidados com o seu médico de família e 80% ao compromisso do governo em apoiar
os prestadores de cuidados domiciliários.
O Júri e os participantes do Inquérito também
se mostraram favoráveis a:● Aumento do debate
público aberto sobre a morte e o processo de morrer – os membros do Júri e a
maioria dos inquiridos no Inquérito 2 afirmaram que deveria haver um debate nacional
contínuo para apoiar o elaboração de qualquer nova legislação e a sua aplicação.● O Júri afirmou que
apoiar um amigo ou familiar a viajar para pôr fim à sua vida numa clínica de
morte ajudada noutro país deve ser descriminalizado. A maioria dos inquiridos
no Inquérito 2 também apoiou esta medida. ● Os membros do Júri também querem que os
profissionais de saúde possam aconselhar as pessoas que procuram morte ajudada
numa clínica de morte ajudada noutro país, uma opinião com a qual 66% dos
inquiridos no Inquérito 2 concordaram.
Existem
opiniões divergentes sobre alguns critérios de elegibilidade:Idade:● Alguns membros do Júri afirmaram
que os menores de 18 anos deveriam ter direito à morte ajudada se tivessem uma
doença terminal e o apoio dos pais para tomar essa decisão. ● Outros membros do Júri votaram
contra a elegibilidade de menores de 18 anos para a morte ajudada, citando
preocupações sobre a sua capacidade e maturidade para tomar uma decisão tão
importante. ● No Inquérito 2, 57%
apoiaram a possibilidade de morte ajudada para menores de 18 anos com uma
doença terminal, mas este valor cai para 47% se a criança não tiver uma doença
terminal.Condições de residência: ● Alguns membros do Júri defendiam
veementemente que apenas os residentes na Inglaterra deveriam ter direito à
morte ajudada na Inglaterra. ● Para outros membros do Júri,
isso não era um problema, pois afirmaram que os não residentes pagariam pelo
serviço, gerando receita para o SNS. ● No Inquérito 2, 51% dos inquiridos eram
favoráveis a que os não residentes em Inglaterra com uma doença terminal fossem
autorizados a viajar para o país para obter morte ajudada, desde que pagassem
por esse serviço. 39% opunham-se a que os não residentes fossem elegíveis para
a morte ajudada.
Os
membros do Júri discutiram quais os requisitos que esperariam em diferentes
fases do processo de acesso à morte ajudada, caso esta fosse legalizada. Entre
estes incluíam-se:● Serviços de
aconselhamento facilmente acessíveis e claramente sinalizados, incluindo aconselhamento e assistência espiritual para apoiar a tomada de decisão antes de um pedido
formal de morte ajudada ser feito. ● Avaliações psicológicas
realizadas repetidamente para garantir que a decisão da pessoa é definitiva e
que não está a ser coagida. ● Um período de reflexão: há opiniões divergentes
sobre se este deve ser um período padrão ou se deve ser permitida alguma
flexibilidade quando a esperança de vida do doente é curta.
Para os
membros do Júri e os participantes do Inquérito, foi essencial que qualquer
nova legislação tenha:● Limites bem definidos
para proteção dos cidadãos vulneráveis e garantia de medidas de salvaguarda
robustas, como partes nucleares da legislação.● Diretrizes de aplicação
incorporadas. ● Clareza sobre o que é e o que não é permitido
pela lei.
O Júri considerou que um tema tão importante
para a sociedade como a morte ajudada deve ser pensado a nível social, independentemente
de opiniões, interesses e preferências individuais, e ter em conta uma
perspetiva de benefício público. Isto significa que os decisores políticos
devem ponderar cuidadosamente se uma alteração da lei trará benefícios para a
sociedade em geral.
[…]
Temas principais e conclusões
(páginas 86-87)
A lei na Inglaterra deve
ser alterada para permitir a morte ajudada?
Sim, a maioria dos inquiridos e a maioria dos
membros do Júri de Cidadãos responderam que a lei em Inglaterra deveria ser
alterada para permitir a morte ajudada.
As salvaguardas e a rigorosa gestão mereceram destaque. Os membros do Júri propuseram o envolvimento de diversos especialistas na elaboração de um quadro de salvaguardas, antes da introdução de qualquer legislação. O objetivo é garantir a confiança da sociedade e proteger as pessoas vulneráveis.
Quais são as razões mais
importantes para uma alteração na lei?
Ao refletir sobre as razões de princípio
para uma alteração da lei, os participantes em ambos os elementos do projeto
chegam a conclusões semelhantes:
●
Prevenção da dor.
●
Pôr fim ao sofrimento de pessoas com uma doença terminal.
●
Dar segurança à escolha.
Quais são as razões mais
importantes contra uma alteração da lei?
De forma semelhante, ao refletir sobre as
razões de princípio contra uma alteração da lei, os participantes partilharam a
opinião de que:
●
Proteger os mais vulneráveis da sociedade é fundamental, mas pode ser muito
difícil de alcançar, ou mesmo impossível, se a lei for alterada.
● Aprovar uma alteração na lei poderia levar a
que a morte ajudada seja vista como uma alternativa normal aos cuidados
paliativos, o que consideraram inaceitável.
Alguns expressaram a opinião de que é sempre
errado tirar uma vida.
Se a lei for alterada,
quais devem ser os critérios de elegibilidade aplicáveis?
Tanto os
participantes do inquérito como os membros do Júri apoiaram:
●
Restringir a morte ajudada a pessoas com doenças terminais – com os
participantes do inquérito a apoiarem um prognóstico de 6 meses e o Júri a não
chegar a um acordo claro sobre os prazos.
●
A doença mental deve ser excluída como critério de elegibilidade.
● Pessoas com capacidade mental para solicitar a
morte ajudada – uma capacidade que é avaliada durante o processo de aprovação.
Houve menos consenso sobre se os seguintes
casos deveriam ser elegíveis para solicitar morte ajudada:
● Menores de 18 anos
● Pessoas que não são residentes em Inglaterra.
Se a lei for alterada, quais os modos e processos de morte ajudada
que devem ser permitidos?
Muitos
membros do Júri concordam em que:
●
Tanto a morte ajudada por um médico (prescrição) como a eutanásia voluntária
(administração) devem ser permitidas.
●
Os profissionais de saúde devem estar envolvidos no processo de morte ajudada.
●
As pessoas devem poder escolher onde a morte ajudada pode ocorrer.
●
Devem estar disponíveis serviços de aconselhamento, informação e outro tipo de
apoio às pessoas que procuram e são elegíveis para a morte ajudada, bem como
aos seus familiares, quando apropriado.
● É necessário um processo formal para solicitar
a morte ajudada.
● Avaliações psicológicas repetidas são
essenciais para garantir que a opinião do doente está definida e para testar se
houve coação.
●
Um período de reflexão daria à pessoa que solicita a morte ajudada a
oportunidade de refletir sobre a sua decisão.
Foram expressas várias opiniões sobre as
diretivas antecipadas, com alguns a verem valor na possibilidade de expressar
uma preferência antes de uma condição ser terminal e outros a temerem que o
pedido possa ser mal interpretado ou ser demasiado inflexível, impedindo as
pessoas de mudar de opinião quando se aproximar o momento.
Quais são as
razões mais importantes para uma alteração na lei?
Os
membros do júri e os participantes do inquérito pediram:
●
Melhorias substanciais nos cuidados de saúde, sociais e paliativos através do
financiamento e de uma distribuição mais equitativa dos serviços.
●
Um debate público continuado sobre a morte, o processo de morrer e a morte
ajudada. O objetivo é sensibilizar, informar sobre as políticas e a sua
implementação e garantir que os cuidados paliativos continuam a ser uma
prioridade na agenda política.
●
O ato de levar um amigo ou familiar para viajar a uma clínica de morte ajudada
no estrangeiro deve ser descriminalizado, acabando com a incerteza.
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