ed. APMGF - ass. port. med. geral e familiar, 2019
Porto, primavera de 2019
[neurologista aposentado, eticista amador,
parceiro de múltiplas atividades com vários membros da equipa da “Horizonte”]
Este armazém foi criado para guardar e partilhar textos (e contextos) que tenho escrito ou traduzido, quase todos ao longo da “terceira” metade da minha vida, mas também antes. Até aos 35 anos formei-me e cresci, até aos 70 exerci e aprendi, agora deu-me para isto... 😊
Porto, primavera de 2019
[neurologista aposentado, eticista amador,
parceiro de múltiplas atividades com vários membros da equipa da “Horizonte”]
Depoimento feito não sei porquê, não sei para onde, não sei bem quando.
Adoro romances! Desde muito novo, aí pelos 16-17 anos, tive várias paixões literárias que me afastavam o sono em compulsivas leituras noturnas, receando que luz do quarto chamasse a atenção dos pais.
Continuo a gostar de romances e, ao longo da vida, alguns
tocaram-me muito. Torna-se difícil dizer qual destacaria entre todos até hoje.
Seria injusto não referir o MEMORIAL DO CONVENTO, de JOSÉ SARAMAGO [1922], porque me fez quebrar uma promessa
solene: nunca mais voltar a Mafra onde sofrera fortemente as humilhações
próprias da formatação para uma guerra odiada. Não mais esqueci, também, da CASA GRANDE DE
ROMARIGÃES onde percebi a densidade e a beleza da escrita de AQUILINO RIBEIRO [1885-1963]. Ou então, quando, já interessado na
política, voltei atrás e me diverti com O CONDE D’ABRANHOS, de EÇA DE QUEIRÓS [1845-1900], uma prosa de que ninguém me tinha
falado no liceu do antigamente. Das noitadas de leitura juvenil, retenho os
livros de JORGE AMADO [1912-2001] e os best-sellers de IRVING WALLACE [1916-1990]
– uma espécie de
DAN BROWN [1964] na época.
Mas, já que devo mencionar apenas um, escolho a ENSEADA AMENA. Aliás, escolhendo esse livro,
escolho toda a obra de AUGUSTO ABELAIRA [1926-2003]
já que, pelo
menos assim me parece, todos os seus livros são a continuação uns dos outros. Abelaira, tão injustamente pouco conhecido,
consegue nos seus romances uma maravilhosa forma de nos mostrar a vida como ela
é, com belíssimos recuos e avanços cinematográficos na caracterização da
realidade.
Os romances, para além de muito contribuírem para a
formação de quem os lê, são também fonte incontornável do culto da língua
pátria. Esse é aliás o gozo e o mérito da literatura ficcional.
Livro médico
Escolho,
entre os livros mais marcantes da área profissional, O MÉDICO, O SEU DOENTE E A DOENÇA, de MICHAEL BALINT [1896-1970], que li demasiado tarde na minha vida de médico. Tivera
eu conhecido os seus ensinamentos no início da profissão e, certamente, teria
sido melhor médico. Muito do que ele ensina (e muito do que se aprende abrindo
as portas que ele mostra existirem no relacionamento com os doentes e as
doenças) é afinal algo que todos fomos aprendendo, por vezes à custa de tantos
erros e frustrações. Independentemente dos méritos dos grupos de autoajuda que
seguem a metodologia preconizada por Balint, pretendo com esta escolha realçar a
importância, tantas vezes menosprezada, da relação, ela própria, na atitude
terapêutica dos médicos.
A Associação Médica Mundial reafirma o seu forte compromisso com os princípios da ética médica e que tem que ser mantido o máximo respeito pela vida humana. Por conseguinte, a AMM opõe-se firmemente à eutanásia e ao suicídio assistido por médico.
Para efeitos da presente
declaração, considera-se haver eutanásia quando um médico administra,
deliberadamente, uma substância letal ou realiza uma intervenção que provoca a
morte de um doente com capacidade de decisão, a pedido voluntário do próprio
doente. O suicídio assistido por médico refere-se aos casos em que, a pedido
voluntário de um doente com capacidade de decisão, um médico deliberadamente
permite que um doente acabe com a sua própria vida, prescrevendo ou fornecendo
substâncias com a intenção de provocar a morte.
Nenhum médico deve ser forçado
a participar em eutanásia ou suicídio assistido, nem qualquer médico deve ser
obrigado a tomar decisões de encaminhamento para esse fim.
Diferentemente,
o médico que respeita o direito fundamental de o doente recusar tratamentos
médicos não age de maneira antiética ao não iniciar ou interromper cuidados
indesejados, mesmo que o respeitar dessa vontade resulte na morte do doente.
Ver original WMA Declaration on Euthanasia and Physician-Assisted Suicide
Ver também, a propósito da diferença moral entre antecipar a morte e deixar morrer, o artigo “Eutanásia ativa e passiva” de James
Rachels (1941-2003), em tradução de Artur Lopes Cardoso que pode ser lida no
sítio Crítica na Rede
A narrativa em torno do plágio
é muitas vezes extremamente simplificada: há um plagiador e há uma vítima.
É uma narrativa simples e convincente. Há uma pessoa má que roubou ou
subtraiu de uma pessoa boa utilizando o seu trabalho, sem a decência de pelo
menos lhe dar o devido crédito.
É um tipo de roubo pessoal e de carácter visceral, que muitas vezes se
assemelha mais ao roubo de identidade do que à violação de direitos de autor
(que é a consequência jurídica mais comum, quando existe). As vítimas de plágio
têm todo o direito de estar zangadas e incomodadas, e a sociedade tem razão em
apoiá-las.
Contudo, as narrativas simples raramente contam a história completa,
especialmente com um assunto tão complicado e matizado como o plágio.
Centrando-se tão fortemente no plágio, a vítima direta não só compreende mal a
natureza do plágio, como corre o risco de dar livre-trânsito a certos tipos de
plágio "sem vítimas".
A verdade é que não há apenas uma vítima na maioria dos plágios, há duas e
é tempo de essa segunda vítima se levantar e ser ouvida. Afinal, ambas estão a
ser mais diretamente enganadas e podem até não perceber que estão a ser
enganadas.
A Segunda Vítima do Plágio
O plágio, no seu nível mais
fundamental, é uma mentira. É a recolha de obras ou ideias de outros e a sua
transmissão, direta ou indireta, como suas. O próprio delito está na mentira, o
"eu criei isto", quando se sabe que não é verdade.
No entanto, essa mentira não está a ser contada à vítima original. É uma
mentira sobre a vítima, afirmando que não esta a criar ou que as suas
contribuições não importam, mas não é uma mentira dirigida à vítima. Na
realidade, é uma mentira dirigida ao público, que é a segunda vítima e o
verdadeiro alvo do delito.
Um plagiador não espera enganar a sua fonte. Ele sabe que a fonte
reconhecerá o seu trabalho e os plagiadores farão muitas vezes um grande
esforço para esconder as suas falsidades daqueles que roubaram.
Em vez disso, tentam enganar o público. Estão a tentar enganar qualquer que
seja o seu público-alvo, seja apenas um professor numa sala de aula ou o mundo
em geral. Dizem a esse público "Eu criei isto" e esperam que o
público confie neles e acredite nisso, mesmo que seja falso.
No entanto, embora a audiência seja a parte a
quem se mente, não é frequente pensarmos qual o impacto dessa mentira. Em vez
disso, o foco é fortemente colocado na fonte original. Por exemplo, quando um jornalista copia de
outros jornais, como aconteceu com Jayson Blair, torna-se um pária. No entanto, o plágio dos comunicados de
imprensa é comum e muitas vezes muito tolerado sob a crença errada de que não
há vítima.
Para a audiência, este delito é o mesmo. O repórter apresenta o seu artigo
como um trabalho da sua autoria mas, pelo contrário, usa o trabalho de outras
pessoas. No caso de plágio de comunicados de imprensa, é o conteúdo de uma
fonte inequivocamente parcial que está a ser apresentado como uma reportagem e
análise supostamente independente.
No entanto, não é apenas no jornalismo que este problema é relevante. Em
qualquer lugar onde se possa encontrar uma vítima de plágio voluntário, pode-se
encontrar um debate sobre se se trata ou não de plágio.
Fábricas de Ensaios, Escritores-Fantasma e Mais
Há dois problemas em colocar
tanta ênfase na vítima original do plágio quando se discute o assunto:
1. Ignora a intenção de plágio. Os plagiadores não pretendem
roubar o outro, mas sim enganar uma audiência. Querem criar algo sem terem o
trabalho. Nunca esteve em causa a vítima.
2. Desculpa uma grande variedade de plágios, mesmo que o logro
seja exatamente o mesmo ou ainda pior.
Um bom exemplo é o da fábrica de ensaios. Se um estudante compra um
trabalho e o submete, o engano é exatamente o mesmo que tivesse copiado o
trabalho da Wikipedia. A única diferença é que o plagiador se esforçou muito
mais para obter o trabalho e esconder o seu delito. O plágio já não é impulsivo
e estúpido, é frio e calculista.
No entanto, muitos ignoram isto ou chamam-lhe qualquer coisa que não um
plágio. O estudante continua a apresentar o trabalho de outra pessoa como sendo
seu. Não importa se o autor original dá a sua aprovação, a mentira fundamental
mantém-se inalterada e continua a haver uma vítima muito real.
A escrita-fantasma produz muitas destas mesmas questões, mas com mais
complexidades. Muitas vezes, a escrita-fantasma é perfeitamente aceitável, uma
vez que o público não tem expectativas de originalidade. Todos sabemos que os
políticos não escrevem os seus próprios discursos e que as celebridades
raramente escrevem os seus próprios livros. A autoria nesses casos é mais uma
"meia-palavra" do que uma verdadeira declaração de originalidade.
Compare-se, por exemplo, com o escândalo do plágio de Cristiane Serruya (Copy
Paste Cris). Aí, uma prolífica escritora romântica foi apanhada a plagiar partes
significativas no seu livro e, quando confrontada, culpou os seus escritores-fantasma.
No entanto, em vez de aplacar a audiência, a admissão do uso de
escritores-fantasma deixou-a realmente mais revoltada. Com a literatura
romântica, a expectativa da audiência é que o autor seja a pessoa que escreveu
o livro ou um pseudónimo da pessoa que o fez. A ideia de utilizar
escritores-fantasma foi absolutamente ofensiva para essa audiência.
Embora a expectativa do público possa ser difícil
de prever, ao longo do tempo formaram-se normas sociais e intelectuais. Não nos surpreendeu saber que Terry
Bradshaw ou Leslie Nielsen usaram um escritor-fantasma para os seus livros, mas se fosse revelado que JK
Rowling ou Stephen King tinham feito o mesmo, seria um choque e causaria uma
grande agitação.
A diferença está em saber se o público foi induzido em erro. Se o público
conhece a verdade e a aceita, não há plágio, pois não há engano e não há
vítima. Se a audiência for enganada, é um plágio, mesmo que o autor original
estivesse de acordo em não ser creditado.
Resumindo
Como uma pessoa que se iniciou no
plágio e nos direitos de autor porque foi uma vítima repetida de plágio, também eu tenho lutado para
ver o outro lado da moeda. Quando se está furioso por ter encontrado dez anos
de trabalho publicado online com o nome de outra pessoa, é difícil
preocuparmo-nos com o que o público pensa.
Contudo, todos nós já vivemos situações em que alguém que acompanhámos,
conhecíamos ou em quem confiávamos não era quem diziam ser. Todos nós já
sentimos esse tipo de traição. Pode não ser a traição pessoal e visceral de ter
o seu trabalho plagiado, mas é uma traição sentida por muito mais pessoas.
Para piorar a situação, a forma como confortamos aqueles que são plagiados
amplifica o problema. Expressões como "o plágio é a forma mais sincera de
elogio" não só banaliza o ato em si, como omite o facto de, dependendo da
natureza do plágio, muitas outras pessoas terem sido provavelmente enganadas e
confundidas.
Além disso, é também uma mentira. Os plagiadores procuram o caminho mais
fácil e obras que sejam adequadas ao seu propósito, não necessariamente as
melhores. As obras são escolhidas mais pela sua acessibilidade e utilidade do
que pela sua qualidade.
É uma triste verdade, mas o plágio prejudica toda a gente no que não é o
plagiador e, ao ignorarmos esse facto, estamos a desculpar um comportamento
detestável e a não compreender realmente o que é o plágio.
Estou indignado. Em tempos de costumeira indignação geral, que a velocidade e dimensão das redes sociais tanto fomentam, sinto-me compelido a expressar a minha indignação num meio clássico mesmo que duvide que consiga apoios suficientes para produzir efeitos neutralizadores.
O sindicato independente dos médicos e a ordem dependente dos médicos recomendam aos profissionais que transferiram responsabilidades para o Estado se algo correr mal em resultado do exercício das suas obrigações.
Contudo, parece que alguém se está a esquecer (Código Deontológico) de que “o médico é responsável pelos seus atos” e que, “nas equipas multidisciplinares, a responsabilidade de cada médico deve ser apreciada individualmente”.
Afirmar não ser responsável pelos seus atos, atirando a culpa para cima, invocando as condições em que se trabalha, pode ser visto de dois modos: (a) se a atitude é permanente, representa uma cega assunção de irresponsabilidade, não compaginável com o mínimo de profissionalismo que se exige; (b) se se trata de uma situação nova, diferente da habitual, faz parecer que o alijar de responsabilidades tem o objetivo único de radicalizar a luta contra os alegados novos responsáveis.
Temos vindo a assistir a uma radicalização das exigências, com recurso a greves cruéis e eticamente insustentáveis, e vemos agora que a mistura de interesses corporativos, sindicais e políticos está a tornar indiferenciável a imagem dos profissionais da saúde da dos camionistas.
Indignado, insurjo-me contra a deriva catastrofista de quem devia antes apelar ao profissionalismo, recomendando acréscimo de atenção aos doentes atendendo às difíceis condições em que se labora.
As organizações que defendem os interesses dos profissionais não podem dizer-lhes que não se importem com o que suceda e que a responsabilidade há de ser assacada a outros. Além do mais, não é verdade: em caso de acidentes ou erros de atuação, a responsabilidade profissional, disciplinar e mesmo penal não se apaga em relação aos agentes envolvidos.
As organizações que defendem a qualidade do exercício de uma profissão, fazendo-o em nome do bem comum, têm o dever de pugnar por melhores condições de trabalho mas não deviam estimular comportamentos que tornam ainda mais arriscado o exercício.
Abaixo as greves na Saúde! Fim à conflitualidade! Denuncie-se o que está mal e procurem-se soluções! É preciso captar a simpatia das pessoas que confiam nos profissionais — não é hora de juntar a voz à gritaria! Pim!
Público, 18.06.2019
Importa sublinhar que o papel do médico não é só tratar, mas também é cuidar compassivamente.
Há poucos dias, uma adolescente holandesa de 17 anos que sofria de anorexia nervosa deixou-se morrer “voluntariamente” com a ajuda da família e dos seus médicos, após deixar de comer e beber.
Houve, a propósito, uma onda de
opiniões mais ou menos indignadas que correu nos meios de comunicação social
clássicos e nas novas redes digitais.
A Real Associação Médica Holandesa
asseverou, contudo, que não se tratou de eutanásia (não houve um ato médico que
provocou a morte) nem de suicídio medicamente assistido (não lhe foi oferecido
pelos médicos qualquer medicamento que ela ingerisse).
A depressão que afetava a menina foi
relacionada com repetidas agressões sexuais e aparentemente era muito grave e
resistente aos tratamentos. Para ela, viver era insuportável mas a lei na
Holanda impediu, neste caso, o deferimento de um pedido de ajuda médica para
pôr termo à vida por duas razões: a) a idade, não dispondo portanto de
autonomia legal para decidir neste âmbito; b) a doença psiquiátrica que
eventualmente a incapacitava para decidir livremente.
E se fosse connosco? Se tivesse sido aprovada qualquer das propostas de lei
que defendiam a despenalização de tais atos, também em Portugal seria indeferido um tal pedido, fosse
ele formulado pela própria ou pelos seus representantes legais.
Importa, ainda
assim, saber se, num caso de “greve de fome” como parece ter sido este, é
legítima uma alimentação forçada ou se é lícito que os seus entes queridos possam/devam
aceitar o facto – deixar morrer quem não suporta mais viver.
E se fosse
contigo? Caro médico de
família ou especialista hospitalar, que faria? A pergunta é independente de
haver ou não legislação que despenalize a ajuda à morte antecipada. Se
tivéssemos, como propunha o Partido Socialista, uma Comissão de Verificação e Avaliação, o seu parecer seria, certamente,
desfavorável pois um tal pedido não estaria abrangido pelas condicionantes
legais. Contudo, depois de esgotados todos os esforços de persuasão e verificada a real ineficácia dos melhores
tratamentos, seria eticamente certo fazer uma entubação gástrica contra a sua
vontade? Ou isso pode ser considerado uma violência se se mantivesse a recusa
em se alimentar?
Na verdade, a uma
pessoa maior de idade que não tenha um diagnóstico de doença mental é pacífico reconhecer-lhe o direito a decidir voluntariamente
interromper alimentos e medicamentos, morrendo consequentemente a curto prazo.
Poderá dizer-se que
um tal direito não está acompanhado de um correspondente dever médico de
assistência. Mas deixar evoluir uma greve de fome, decidida livremente, sem medidas
terapêuticas que atenuem o sofrer final ou sem apoiar
psicologicamente o próprio e os familiares presentes, há de ser considerado um
virar de costas insensível e maléfico, sem sustentação
deontológica. Recordo o caso de um sexagenário que conheci bem e que sofria de
uma depressão resistente. Internado numa instituição psiquiátrica, manteve uma
lenta e progressiva redução da alimentação, ficando em enorme fragilidade
e perda de peso. Afetado por uma grave pneumonia bilateral, deu entrada num
hospital geral em estado de grande agitação motora, semi-inconsciente e com imensa
falta de ar. Quando o visitei, vi que estava entubado, com soros e antibióticos
e amarrado ao leito. Perguntei porque não lhe davam algum sedativo que lhe
atenuasse o evidente sofrimento. Foi-me dito que era perigoso pois poderia
morrer. Morreu dois dias depois, exausto da batalha.
Importa, portanto,
não confundir a eventual ajuda médica ao pedido de morte antecipada feito por
pessoa capaz de decidir com o lícito dever de amenizar a morte iminente.
Importa, também, saber reconhecer que há diagnósticos que trazem consigo uma
conhecida taxa de mortalidade (cerca de 6%, dos quais cerca de uma quarta parte
relacionada com suicídio – Gibson et al, Medical Complications of
Anorexia Nervosa and Bulimia Nervosa, Psychiatr Clin N Am 42 (2019)).
Importa, finalmente, sublinhar que o papel do médico
não é só tratar mas também é cuidar compassivamente.
Resumo
Os doentes afirmam
frequentemente o seu desejo de ter um fim da vida confortável, embora os
médicos se debatam sobre a melhor maneira de oferecer conforto e enfrentem o
dilema ético entre tratar ou permitir que uma possível infeção se desenvolva. Tratar
uma infeção no fim de vida não permite uma melhoria uniforme nos sintomas nem mais
tempo com a família e amigos. Além disso, há potencialmente custos para o
doente ou o sistema de saúde e o tratamento pode decorrer com exclusão de
outras medidas de conforto. Atualmente, a prática de administrar ou abdicar de
antibióticos no fim de vida é variável e a literatura a favor das melhores
práticas é contraditória. Os dados para apoiar o uso ou a suspensão dos
tratamentos têm sido escassos e variam entre cenários e populações de doentes.
Analisámos os obstáculos mais comuns enfrentados pelos prestadores de cuidados,
as ferramentas de prognóstico que podem auxiliar a tomar decisões clínicas, o suporte
ético para a suspensão de terapêuticas e como decompor as causas do peso
potencial dos tratamentos. Pensamos que os enfermeiros, à beira do leito, numa
unidade de cuidados intensivos, num lar ou num domicílio, como membros de
equipas interdisciplinares de cuidados paliativos, estão especificamente qualificados
para ajudar doentes e familiares a lidarem com essa desafiante decisão clínica.