Sedação paliativa
Tradução espontânea de 2 textos encontrados em Gènétique – 1ersite d’actualité bioéthique, de 2015.
Sylvain Pourchet, antigo diretor da Unidade de Cuidados
Paliativos do Hospital Paul-Brousse em Villejuif, foi entrevistado pelo
Ouest-France sobre o novo direito à sedação profunda e contínua criado pela
proposta de lei Leonetti-Claeys. Sylvain Pourchet começa por limitar o debate
ao precisar que o fim de vida não é sinónimo de sofrimento e que "a agonia não é forçosamente
dolorosa". Recordou igualmente que "é natural morrer" e que morrer não é, em si, uma
doença. À pergunta de se saber se a sedação é uma boa solução para evitar que o
doente sofra no fim de vida, responde: "Não
pensem que o fim de vida é doloroso e que o seu tratamento é a sedação. As
coisas não são assim", pois a sedação "é uma paralisia, não um sono". A sedação pode ser utilizada quando
se esgotaram "todas as outras
formas de tratamento – suficientes na maioria das situações". Sylvain Pourchet especifica que a
sedação nada consegue contra os sofrimentos existenciais, pelo contrário. "A sedação interrompe a relação. Ora, a
relação é o melhor tratamento da angústia." A sedação como resposta única
vira-se contra os doentes em fim de vida. "Quando pensamos resolver tudo apenas com um medicamento, impedimos a procura de
soluções melhores, as mais adequadas ao doente e à sua situação."
Na proposta de lei Leonetti-Claeys está também prevista a criação de um direito a diretivas antecipadas exequíveis. A associação destes dois novos direitos tem por consequência tornar possível a prescrição de um tratamento (sedação) sem "bases médicas" (na vontade do doente). Para Sylvain Pourchet, se cabe ao médico "ratificar" um direito do doente e não é precisa a competência médica, "por que terá o médico de ser chamado?" A entrevista conclui com um apelo cheio de sabedoria: "O direito fundamental do doente não é o de prescrever o seu medicamento mas o de ser tratado o melhor possível em quaisquer circunstâncias".
O semanário Famille
Chrétienne dedica o
dossiê desta semana ao fim de vida e à proposta de lei Leonetti-Claeys, que
passou na comissão em 17 de fevereiro e será discutida pelos deputados a 10 de
março.
Por que
é que a "sedação contínua e profunda até ao falecimento" põe
problemas?
A proposta de lei Leonetti-Claeys introduz uma nova
prática de sedação que põe numerosas questões éticas – a "sedação contínua e profunda até ao
falecimento". Se, enquanto for intermitente, "a sedação é um gesto de bom tratamento pois é reavaliada
continuadamente", refere o Dr. Pascale Vincent [1], a sedação contínua priva o doente
das suas capacidades relacionais e da sua autonomia. Além disso, a sua intenção
não é clara. "Estamos na fronteira
da eutanásia", comentou a Dr.ª Blanchet [2]. E o Dr. Gomas [3] confirmou que "muitos
doentes veem já o seu fim de vida acelerado por sobredosagens". "Para uma grande parte das equipas de cuidados
intensivos, a proposta de lei Leonetti-Claeys contribui para a confusão entre sedação e eutanásia", segundo a análise do semanário. Sendo
certo que a prática da sedação é mais controlada em serviços especializados do
que em equipas móveis e em serviços sobrecarregados, o risco de sedações
excessivas e da sua generalização é bem real.
A
"morte a dormir" é um bem?
Adormecer um doente não causa morte imediata. O Dr. Gomas
chama a atenção para o que a proposta de lei não tem em conta: "mesmo quando se interrompem todos os
tratamentos, inclusive a alimentação e a hidratação,
se o doente não se deixa ir, este pode sobreviver dias e dias". [4] "No
final de contas, quem adormecemos com este novo direito? O doente? A morte? Os
que pedem eutanásia? As
suas famílias? Ou será toda a sociedade?" pergunta o jornal. Segundo a Dr.ª
Blanchet, "fazer crer que a morte ideal é uma morte a dormir é um
fantasma". Fazer crer ao doente que ele pode dominar a sua morte com
uma última "automedicação" é um engano, dada a situação de
fragilidade psicológica no limiar da sua vida.
Jean
Leonetti ficou aprisionado neste "novo direito"?
Em fevereiro de 2012, Jean Leonetti afirmou que "hoje em dia, na França, a lei sobre o
fim de vida define os limites até onde se pode ir sem conceder voluntariamente
a morte". Ir além da lei de 2005 seria "ultrapassar a linha vermelha". Então o que se passou para JeanLeonetti aceitar redigir uma proposta de lei com Alain Claeys? Diz-se que está atormentado pelo caso Hervé Pierra, o jovem que faleceu em 2006. Jean
Leonetti reconhece que a sedação pode ser "ambígua" e que "
pode ser estreita a fronteira" com a eutanásia. Fez saber que se o teor da
sua proposta de lei for alterada pela maioria, não quererá mais ser seu relator e que depois essa lei "ficará sem mim". Alguns deputados deram a entender que
Jean Leonetti está condicionado pelo governo. "Foi bem jogado", reconheceu Philippe Gosselin (UMP,
Manche) pois Jean Leonetti chamou a atenção da Assembleia para o facto de a sua
precedente lei ter sido votada por unanimidade. Para Jean-Frédéric Poisson
(UMP, Yvelines) "tentar
encontrar um compromisso é entrar na lógica da maioria", pois "sabemos que se a esquerda se distanciar do seu pensamento, ele votará contra, segundo
me disse". Por outro lado, Véronique Besse (Vendée), com cerca de 80
deputados, apresentou uma proposta de lei para o desenvolvimento de cuidados paliativos
que recusa "o adormecimento
definitivo como única solução".
[1] O Dr. Pascale Vincent é responsável da equipa de cuidados paliativos do hospital Cochin.
[2] A Dr.ª Véronique Blanchet é especialista em dor e cuidados paliativos dos Hospitais universitários Est Parisien-Saint-Antoine.
[3] O Dr. Jean-Marie Gomas é médico coordenador da unidade funcional "dores crónicas – cuidados paliativos" no hospital Sainte-Périne (Paris).
[4] Cf. Vincent Lambert que sobreviveu 31 dias à primeira tentativa de eutanásia da sua equipa médica em maio de 2013.