11 fevereiro 2015

Dor crónica – A Crise Invisível da Saúde Pública

 


Dor crónica – A Crise Invisível da Saúde Pública
Richard Payne

Tradução espontânea do texto 

Apelo a uma liderança moral

Sou um homem invisível. Não, não sou um fantasma como os de Edgar Allen Poe, nem sequer um desses ectoplasmas de Hollywood. Sou um homem com substância, de carne e osso, fibra e líquidos – e devo dizer que também penso. Sou invisível apenas porque as pessoas se recusam a ver-me” – Ralph Ellison

O famoso romance de Ralph Ellison, O Homem Invisível, começa com esta passagem que me faz lembrar o problema da dor crónica. O relatório do Institute of Medicine (IOM), “Combater a Dor na América”, documentou que mais de 100 milhões de americanos (quase 1 em cada 3 e, certamente, alguém que conheces ou de quem gostas) sofre de dor crónica, com um custo económico de 6 mil milhões de dólares e custos psicológicos incalculáveis. Chamamos “doença” à dor por causa dos seus profundos efeitos no cérebro e da sua intromissão em múltiplos domínios da qualidade de vida dos afetados. A comissão identificou a dor crónica como um problema de saúde pública, tendo em conta os números absolutos citados e as possibilidades de evitar que a dor aguda se transforme em dor crónica. Contudo, o relatório já tem quatro anos e, é justo dizer, não mudou o rumo das coisas como ali era pedido – “mudar o modo como se considera, vê e lida com a dor”. Por que é assim?

Porque a dor é subjetiva – e isso dificulta ser medida por testes médicos habituais – ela é frequentemente posta em dúvida. Como disse alguém, a minha dor é real e da tua duvido. Igualmente, vivemos uma grande ambivalência cultural sobre a dor. Os ícones culturais como Júlio César e Albert Schweitzer são citados por terem dito que a dor é pior do que a morte, mas há também um etos em que “o que arde, cura”. As intervenções médicas, nomeadamente os poderosos fármacos opioides como a morfina e a oxicodona, embora essenciais para lidar com a dor aguda e persistente, acarretam o custo de muitos efeitos colaterais e podem induzir dependência psicológica em algumas pessoas. As pessoas com dores e os seus médicos temem a dependência dos opioides embora não saibamos verdadeiramente qual o risco dessa dependência em pessoas que não tenham abusado de drogas ilícitas ou recreativas. Por essas e outras razões, tanto individualmente como na sociedade, preferimos ignorar o problema da dor crónica… exceto quando nos confrontamos com ela nas nossas vidas pessoais.

Então, como compaginar o imperativo moral de combater a dor e o sofrimento na nossa prática médica contemporânea, como nos dizem os códigos éticos e os juramentos profissionais? Como trazer para a luz o sofrimento invisível de tantos e como trabalhar para o aliviar? Penso que nos devemos empenhar em cinco grandes objetivos:

   1. Defendemos mais e melhor ciência para compreender a neurociência subjacente à origem e variabilidade da dor. Isto exige pressão sobre o Ministério da Saúde e outras agências nacionais para que financiem justamente estudos relacionados com os mecanismos da dor e ensaios clínicos de tratamentos da dor.

   2. Defendemos mais e melhor progresso farmacêutico, incluindo a criação de formulações dissuasoras de abuso de opioides e de novos analgésicos não-opioides. Isto exige pressão para que haja parcerias público-privadas eficazes entre a indústria farmacêutica, as universidades e as agências oficiais.

   3. Defendemos e pedimos melhor educação dos profissionais de saúde para que cumpram as suas obrigações de modo competente e tratem a dor e o sofrimento dos seus doentes. Também defendemos melhor educação pública de modo a que as pessoas com dor crónica compreendam que isso é uma doença e que não aceitem ilusões.

   4. Defendemos e pedimos melhores soluções políticas que proporcionem programas de tratamento da dor sustentáveis, centrados nos doentes e dirigidos realmente às necessidades dos doentes e dos seus cuidadores.

   5. Finalmente, precisamos da colaboração efetiva numa agenda partilhada entre especialistas em dor e especialistas em dependências para exigir cuidados abrangentes, centrados na reabilitação, dedicados à dor crónica e maior acesso a tratamentos de dependência de substâncias para as pessoas que têm o diagnóstico duplo de dor crónica e dependência.

É o que penso. O que pensas tu?