Primeiro, é disparatado, é
absurdo, pois pretender instituir uma taxa moderadora para queixas não modera
e, mesmo que moderasse, nunca se deveria obstaculizar o legítimo direito de
alguém se queixar. A principal missão das ordens profissionais
é precisamente evitar que alguns contribuam para a má fama de todos os outros
profissionais. Ao contrário do que privilegiam –
defender, como se fossem sindicatos, os interesses dos seus associados – as
ordens foram criadas para perseguir os falsos profissionais e os maus profissionais.
Receber queixas é a sua obrigação primordial, combatê-las é um desatino.
Segundo, é um clamoroso
contrassenso, pois só favorece que o comum dos mortais consolide a velha
acusação de que as ordens só servem para que “eles” se protejam uns aos outros.
Em vez de dar sinais de que os dirigentes da Ordem dos Médicos prestam atenção
aos anseios e protestos que lhes chegam, vemos a criação de barreiras. Se é
verdade que a OM não tem, pelos estatutos atuais, meios legais adequados para
investigar até ao fim certas queixas, não há qualquer indicação
que seja por falta de meios financeiros que esteja
impedida de o fazer.
Terceiro, é um erro horrível
argumentar que a taxa será devolvida quando a queixa tiver fundamento. Significa
que quem se atreve a propor tal medida tem dificuldades em perceber que
o queixoso tem sempre razão. Não se trata de ser popular ou politicamente
correto! É verdade! O “cliente tem sempre razão” ou, por outras palavras, quem
reclama só o faz porque
pensa que tem razões para o fazer. Não vale a pena contrapor a existência de
litigantes patológicos ou de reclamantes obstinados, pois, além de minoritários,
estão, quase sempre, também eles, convencidos de que têm razão. A boa análise
de reclamações obriga-se a partir do princípio de que é no meio da lana-caprina
que se hão de encontrar as linhas gerais do que é preciso corrigir.
Quarto, é um susto já que não se conhece o
conteúdo dos novos estatutos da Ordem dos Médicos que estarão à espera de ser
aprovados pela Assembleia da República. Não os encontramos no sítio da OM ou da
AR, nem na revista da OM. Os estatutos que os órgãos executivos da OM aprovaram
não são do conhecimento público nem dos médicos. Sabemos que uma comissão foi
encarregada de elaborar uma versão. Sabemos que foram enviadas propostas e
sugestões, mas não sabemos o que foi submetido ao legislador. Perceber, no dia
em que o bastonário é reeleito numa eleição sem oponentes, que os estatutos
propostos contêm um tal disparate, um tal erro e uma tal insensatez só pode
levar a que receemos o mais que virá.
Já não exerço a profissão, mas sendo, por direito próprio, associado da OM não consigo calar a minha indignação e, se esta medida for por diante, só me resta pôr fim a um vínculo ininterrupto com mais de 40 anos.