21 agosto 2008

Um futuro à medida dum passado

 


Um futuro à medida dum passado

Convidado a redigir um texto comemorativo dos 25 anos do SMN, refleti sobre a forma que havia de dar ao solicitado e não encontrei maneira de evitar uma abordagem algo autobiográfica.

Na verdade, se há coisa que me envaideça é ter sido um dos fundadores do Sindicato que, na década de 80 do século passado (1), entenderam que os médicos necessitavam de se organizar para defesa dos seus interesses enquanto trabalhadores por conta de outrem.

Orgulho-me em especial de, depois de ter sido membro da comissão instaladora, da direção provisória, da primeira direção eleita e de ter saído de cena, ter sido “contemplado” com o número 1 na recontagem dos sócios. (atualização: desfiliei-me em 2023)

Ao longo da minha vida profissional, cujo percurso tem sido algo atípico, envolvi-me em diversos movimentos associativos, onde penso poder encontrar um fio condutor a que poderia chamar uma espécie de frentismo unitário.

Foi o caso, por exemplo, da Liga da Epilepsia onde exerci cargos diretivos, conseguindo juntar interesses de vários técnicos de saúde (neurologistas, psiquiatras, pediatras, psicólogos, neurofisiografistas), de doentes e dos seus familiares.

Foi o caso de uma participação da direção da Ordem do Médicos, sob o signo da “Casa de Todos os Médicos” (2), que reuniu vontades de diferentes organizações médicas.

Foi, faz agora 25 anos, o caso da criação do Sindicato dependente dos Médicos que, desde sempre, asseverou que os interesses que defendia eram compatíveis com os interesses das populações.

Recordo a facilidade com que discutíamos os problemas e as atuações sem curarmos de saber a que partidos políticos pertenciam os interlocutores.

Recordo o empenhamento construtivo que a FNAM teve na edificação do SNS como nós hoje o conhecemos.

Recordo também como era difícil para alguns acreditarem que gente como nós se envolvia nestas tarefas por vontade e convicções próprias e não como mandaretes partidários ou serventuários ocos de controleiros reais ou imaginários.

Daí que, mesmo tendo deixado de ter filiação partidária e cético das virtualidades da Ordem enquanto defensora do exercício da Medicina, mesmo tendo deixado de exercer atividades clínicas, me mantenha associado do SMN apesar das divergências frequentes com o seu discurso.

É por isso que me sinto à vontade para usar este pretexto para retomar uma opinião que tornei pública em 2002 sobre a greve dos médicos.

Continuo a considerar que o movimento sindical médico ganhava em declarar, com pompa e circunstância, que suspendia o recurso à greve como meio de fazer valer os seus pontos de vista em negociações com os governos.

Defendi e defendo que uma tal declaração, preferentemente assumida fora de ciclo negocial, teria o apoio de muitos que não aceitam que seja o doente a pagar um conflito de interesses que o ultrapassa.

Acredito que um sindicato de novo rosto poderia, nesta posição ética, encontrar meios originais de trazer os utentes do SNS para aliados do seu campo, na luta contra os poderes, quando isso lhes fosse claramente demonstrado.

Penso que, aproveitando as comemorações do passado para delas extrair lições de futuro, importa encontrar novas caras, novas palavras e novas formas de efetivamente defender os médicos.

Quero crer, tal como acredito que os interesses dos médicos são compatíveis com os interesses das populações, que os associados hão de alinhar com dirigentes que sejam tanto capazes de criticar um Ministro como de aplaudir medidas de interesse público.

Nos dirigentes do Sindicato dos Médicos do Norte vejo que se mantém um real espírito de abertura e de busca de unidade e, ao agradecer terem-me convidado a participar no Congresso de Abril de 2007 (como moderador de um debate sobre os direitos dos utentes), desejo-lhes êxitos para atraírem, cada vez mais, novos associados e novos dirigentes.

O passado deste organismo vivo merece um futuro de que nos possamos orgulhar.

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1 VI Governo Constitucional (1980-81): Sá Carneiro e Morais Leitão/Costa e Sousa. VII Governo (1981): Francisco Balsemão e Carlos Macedo/Paulo Mendo. VIII Governo (1981-83): Francisco Balsemão e Luís Barbosa/Paulo Mendo. IX Governo (1983-85): Mário Soares e Maldonado Gonelha. X Governo (1985-87): Cavaco Silva e Leonor Beleza/Baptista Pereira. XI Governo (1987-91): Cavaco Silva e Leonor Beleza/Faria Almeida/Costa Freire/Albino Aroso/Dias Alves e Arlindo Carvalho/Albino Aroso/Jorge Pires.
2 Bastonário Santana Maia (1993-95) e Bastonário Carlos Ribeiro (1996-98)