Quando e Como Pedir Desculpa aos Doentes
Roger Sergel
Tradução espontânea do artigo When and How to Say Sorry to Patients
Pedir desculpa não significa perder um processo por negligência – pode até evitá-lo
Parece tão fácil dizer que
os profissionais de saúde precisam estar dispostos a pedir desculpa aos seus doentes.
Mas não é tão simples assim. Como Ron Harman King, da Vanguard Communications,
debate neste número da Wired Practice, há que não ignorar as questões legais.
Tenho algumas boas notícias
para lhe dar: se é prestador de cuidados de saúde em Ohio, você não precisa
mais de se preocupar em perder uma ação judicial de negligência só porque pediu
desculpas a um doente. Um recente acórdão do Supremo Tribunal de Ohio refere
que os médicos naquele Estado desfrutam agora de proteção jurídica especial sob
o que se chama uma “lei de proteção das desculpas”.
O tribunal estabeleceu que um
pedido de desculpas apresentado por um prestador de cuidados a um doente não
pode ser admitido como prova num processo civil – mesmo que o pedido de
desculpas expresse culpa ou o “reconhecimento de que o cuidado ao doente foi
abaixo da norma”. Massachusetts foi o primeiro Estado a aprovar uma lei de
proteção das desculpas, em 1986, e, desde então, cerca de três dezenas de
outros Estados aprovaram leis similares protegendo “declarações e gestos
benevolentes para com os doente e familiares após um resultado inesperado”.
Agora, por favor, note que
algumas leis fixam um limite de tempo para a inadmissibilidade de um pedido de
desculpas de três a trinta dias. A intenção é incentivar os médicos a
comunicarem com os doentes mais cedo e com mais frequência. E a isso eu digo: bravo!
Ao lidar com doentes lesados, às vezes, a melhor solução é fazer uma declaração
conciliatória razoável.
Mas espera aí. Aguenta. É aqui
que as coisas se complicam. Quando e como os prestadores de cuidados de saúde
devem, exatamente, pedir desculpa? Esperando responder a esta pergunta,
consultei o dicionário Webster e encontrei várias definições para a palavra
‘desculpa’, que pode ter significados vários, uma justificação formal, um
lamento, a defesa ou admissão de erro ou grosseria.
Na minha experiência, não me
lembro de ver maus resultados de um só erro. A meu ver, resultados clínicos
fracos são predominantemente complexos e multifatoriais e, muitas vezes,
surpreendentemente, os doentes e suas famílias não procuram realmente uma confissão
dos prestadores – procuram apenas palavras de apoio. Vou contar-vos uma
história ilustrativa. Há uns anos, um colega meu era presidente do conselho de
administração de um grande hospital. Infelizmente, durante o seu mandato, o
pessoal do hospital deu uma sanduíche com manteiga de amendoim a uma criança,
doente com graves alergias alimentares, que rapidamente morreu. A mãe da
criança, de seguida, processou o hospital, e o caso arrastou-se por anos,
terminando numa indemnização à família.
Durante todo o processo legal,
os advogados do hospital proibiram qualquer pessoa do hospital de contactar com
a família. Após a resolução, o presidente do conselho de administração liderou
um pequeno grupo de representantes do hospital que visitou a família e
apresentou condolências. A reação da mãe deixou todos sem palavras. “Isso é
tudo que eu sempre quis”, disse ela, “ouvir alguém – qualquer um – do hospital
dizer que lamentava muito a nossa perda. Se eu tivesse ouvido isso depois de o
meu filho morrer, nunca teria havido uma ação judicial”.
A
lição óbvia é que uma mera palavra de conforto pode mesmo impedir uma tonelada
de custas judiciais. Isto é reforçado por estimativa em que 95% dos processos são resolvidos fora do tribunal. Mas a lição menos óbvia é que
quem apresenta desculpas pode ser muito seletivo sobre aquilo de pede desculpa.
Ou – mais precisamente – uma opção muito eficaz e viável pode não ser apenas
pedir desculpas, mas sim oferecer empatia de modo a reforçar o impacto de um
pedido de desculpas. Nesse sentido, voltei novamente ao dicionário procurando a
palavra certa, mas não conseguiu encontrá-la. Então inventei uma nova palavra: empathology,
uma mistura de empathizing e apologizing [poderia ser, em português, “empaticodesculpas”].
No caso da mãe sofredora, cuja
história ouvi recontada, os representantes do hospital disseram apenas que
lamentavam muito a perda do seu filho. De acordo com o que contou o meu amigo,
ninguém disse, “a morte de seu filho foi inteiramente culpa nossa”. Sem saber
os detalhes, imagino que os factos do caso eram complexos e que advogados da
outra parte lutaram por provar que o hospital fez o que era razoável para lidar
com a extrema condição alérgica da criança.
Sem dúvida que a mãe sentiu que
o hospital podia fazer mais. Mas ela também se conformou com os riscos que
corria o seu filho antes da sua hospitalização. Não obstante, a sua resposta à
visita mostrou que queria mais conforto do que vingança. Tivesse sido visitada
mais cedo, todos teriam sido poupados a anos de gastos e de tensões próprias de
um processo legal.
Lembremo-nos: há um momento
para um pedido de desculpas total, sobretudo depois de uma indelicadeza.
Participei num exemplo recente. Ao falar com um doente, um profissional
referiu-se aos seus longos anos de luta pela saúde como “um pequeno problema”.
Vejamos, o profissional estava legitimamente incomodado com um ser humano
totalmente irracional que se recusava a aceitar que o agravamento das suas
doenças não era devido aos seus tratamentos, mas acontecia apesar deles. Não
importava. O equívoco de linguagem bloqueou os ouvidos do doente e apenas
alimentava a sua ira. Um breve e calmo pedido de desculpas pelo uso de um
adjetivo insensível poderia ter estancado a ira e levado a uma resolução.
Aqueles de nós que andam no
campo da gestão de reputação no setor de saúde, conhecem um ditado que diz que
não se pode soletrar a palavra ‘prática’ sem o PR [Public Relations]. Muito do trabalho dos profissionais é prestar tanto
cuidados físicos como emocionais – e às vezes aconselhamento no luto – quer
sejam acompanhados de um pedido de desculpas ou de qualquer outra coisa.
Agora que os médicos obtiveram um adicional de proteção
legal para expressarem arrependimento, da próxima vez que você se confrontar
com um doente transtornado, considere se pode estar na hora de dizer “desculpe”
de modo algo diferente. Talvez seja o momento de mostrar empaticodesculpas.
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Medical Association's Code of Medical Ethics, which also covers some of this
ground.