A lei das associações públicas profissionais (1), recentemente aprovada, estipula (artigo 8.º) que os seus estatutos «devem regular» o «Provedor dos destinatários dos serviços, se o houver».
A mesma
lei refere (artigo 18.º) que o «provedor
dos destinatários dos serviços, quando exista», tem «legitimidade
para participar factos suscetíveis de constituir infração disciplinar ao órgão
com competência disciplinar».
Sobre
esta nova figura, a lei estabelece que, «sem prejuízo do estatuto do Provedor de Justiça, as associações
públicas profissionais podem designar uma personalidade independente com a
função de defender os interesses dos destinatários dos serviços profissionais
prestados pelos membros daquelas» e que este provedor «é designado nos termos previstos nos estatutos da
associação e não pode ser destituído, salvo por falta grave no exercício das
suas funções»
(artigo 20.º).
O mesmo
artigo atribui ao provedor a competência de «analisar as queixas apresentadas pelos destinatários dos
serviços e fazer recomendações, tanto para a resolução dessas queixas, como em
geral para o aperfeiçoamento do desempenho da associação», determinando que o cargo possa «ser remunerado, nos termos dos estatutos ou
do regulamento da associação» e que «a
pessoa designada para o cargo de provedor [caso seja seu membro, deve requerer] a suspensão da sua inscrição».
Havendo
notícia de que a Ordem dos Médicos tem em curso a revisão dos seus estatutos,
bom seria que não se perdesse a oportunidade de demonstrar que a nossa
associação pública profissional não deixa os seus créditos por mão alheia,
apesar de a lei permitir, aparentemente, que a existência de um provedor seja
opcional.
Se é
certo que a Ordem dos Médicos, enquanto associação pública profissional, tem
por primeira atribuição a «defesa
dos interesses gerais dos destinatários dos [seus] serviços» (artigo 5.º), sabemos como tem sido
predominante a «representação
e a defesa dos interesses gerais da profissão» e, quiçá, dos profissionais. É por isso que, salvo
melhor opinião, instituir um Provedor da Medicina, no seio da Ordem, poderia
significar uma nova e sincera postura, no respeito pelo que consta do atual
Estatuto (2), como primeira das suas finalidades essenciais: «defender a ética, a deontologia e a
qualificação profissional médicas, a fim de assegurar e fazer respeitar o
direito dos utentes a uma medicina qualificada» (artigo 6.º).
O
Provedor da Medicina deveria ser escolhido através de um concurso, com regras
predefinidas, a que pudessem apresentar-se médicos que tivessem atingido, pelo
menos, o grau de chefe de serviço ou equivalente, aposentados (ou no ativo, mas
dispostos a suspender a sua atividade), que se manifestassem dispostos a
desempenhar o cargo por um período de 4 anos e se obrigassem a fazê-lo de modo
tão discreto quanto autónomo.
A gestão
das reclamações recebidas na Ordem, relativas ao desempenho de médicas e
médicos, deveria ser feita de tal modo que as questões que o Provedor
apresentasse aos visados necessitariam de uma resposta imediata, sendo a sua
ausência penalizada adequadamente. As recomendações do Provedor deveriam ter um
embargo de publicidade, com prazo por este estabelecido, e definitivamente
arquivadas sem publicidade em caso de total satisfação. O Provedor, a quem
deveria ser disponibilizado apoio administrativo e jurídico prioritários,
deveria assumir o compromisso de não conceder entrevistas ou emitir notas à
Comunicação Social, salvo em casos excecionais e precedidas de participação ao
Bastonário e tempo suficiente para uma resposta deste.
Creio
bem que este tema poderia dar origem a um debate interessante e proveitoso.
(1) Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro
(2) Estatuto da Ordem dos Médicos, Decreto-Lei N.º 282/77, de 5 de julho