Receitar um medicamento é um ato médico que representa uma certa recomendação ao doente. Tal como quando propomos uma intervenção cirúrgica ou a realização de um exame de diagnóstico, cabe-nos informar o conteúdo da nossa proposta ou recomendação.
Informar é, afinal, a condição prévia à adesão do doente e essencial à sua
capacidade de decisão. Informar é não só reconhecer autonomia como respeitar
essa mesma autonomia.
Muitos afirmam a sua fidelidade aos princípios da ética biomédica de
Beauchamp e Childress, mas outros tantos os esquecem no quotidiano. Estes
princípios – autonomia, justiça, fazer bem sem fazer mal – são preceitos
fundamentais da profissão e, por isso, são a base da nossa prática.
Ao prescrever, temos, assim, o dever de explicar, tendo em atenção as
capacidades do destinatário, o que estamos a propor, as suas finalidades e,
quando adequado, os riscos inerentes.
Não é lícito invocar que o doente não entende – pelo contrário, quanto
mais limitada a capacidade de entender, mais se impõe a necessidade de
explicar.
Se existem diversas marcas comerciais de um mesmo produto mas certificadas
pelas autoridades competentes, é dever do médico prescrever a marca mais barata
ou, pelo menos, permitir que o doente prefira a mais barata.
Se alguém tem conhecimento de que uma marca de um determinado produto não
tem a qualidade exigida, deve em consciência explicar ao doente a razão da sua
rejeição. Não é lícito adotar uma posição de princípio contra todo e qualquer
medicamento mais barato.
A regra geral de que uma prescrição não deve ser alterada pelo vendedor é
uma garantia de que o ato médico proposto responsabiliza exclusivamente o
prescritor.
Permitir que o destinatário da prescrição exerça a sua autonomia e opte
por uma marca mais barata, sob garantia oficial de qualidade, é, a meu ver, uma
regra que faz falta.
Defender que o médico possa, arbitrária, ideológica e preconceituosamente,
impedir o doente de optar é, no mínimo, uma posição insensata.
Se eu mandasse, corrigia os dizeres do receituário oficial. Em vez de “autorizo
o fornecimento ou a dispensa de um medicamento genérico”, colocava o seguinte: “expliquei
os motivos por que, neste caso, não recomendo que haja opção por medicamento genérico”.
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Declaração de
interesses: estou aposentado, retirado de todas as atividades clínicas e não
tenho qualquer interesse nos lucros de qualquer farmácia ou no poder de
qualquer associação de vendedores de medicamentos – sou consumidor. Este
depoimento foi-me solicitado pela redação da revista da Ordem dos Médicos