Algumas vezes têm surgido dúvidas
quanto às eventuais sobreposições de tarefas e às vantagens em particular nas
diversas formas do associativismo médico. Há quem entenda que deveria haver só
uma organização visto serem os Colegas, os Sócios ou os Associados sempre os mesmos.
Sou de opinião que o papel dos
Colégios é agrupar todos e só aqueles que estão credenciados pela Ordem dos Médicos
com um determinado título. O Colégio elege periodicamente uma direção ou
comissão diretiva que funciona como órgão de consulta dos restantes órgãos da
Ordem – tem funções consultivas e dá pareceres técnicos que mais ninguém pode
dar. A direção eleita pelos Colegas de uma determinada especialidade ou sub-
especialidade recebe assim un mandato que também inclui o de credenciar e
admitir novos Colegas. A escolha da direção de um Colégio recai assim em
personalidades com méritos profissionais reconhecidos pelos seus pares. Os
Colégios são o garante da qualidade do ato médico tal como, em última análise,
a Ordem preconiza .
Penso, por outro lado, que as
Sociedades Científicas procuram atingir um objetivo que se torna difícil ser assumido
pelos Colégios. As Sociedades têm uma dinâmica própria já que visam a promoção
da qualidade na área do conhecimento a que se dedicam. Pelo facto de
organizarem reuniões e de estimularem os seus membros a apresentarem os seus
trabalhos, assim como pela criação de prémios e bolsas, as sociedades criam as
condições para o aparecimento de progressos científicos e ajudam à formação de
boas normas de conduta técnica. Os especialistas que não frequentam as reuniões
das suas sociedades são habitualmente aqueles que mais dificuldades têm em se
manter atualizados. As direções das Sociedades não precisariam de ser constituída
pelos sócios mais cotados cientificamente mas apenas pelos mais ativos e
empreendedores mas, naturalmente, os sócios acabam escolhendo os que reúnem
ambas as facetas. O papel das Sociedades Científicas nos avanços da medicina
portuguesa é da maior importância e mereceria estudo apropriado, sem esquecer o
contributo de outros técnicos não-médicos que a pluridisciplinaridade atual
chamou para o seio das Sociedades. As Sociedades Científicas são os motores da
qualidade.
Creio que as Associações de
interesse são organizações que resultam da necessidade de reunir esforços e de
promover a defesa dos interesses surgidos nos diversos tipos de relações que os
médicos têm. Desde logo, cite-se o papel incontestado dos Sindicatos ao assumir
as relações próprias de quem trabalha por conta ele outrem. Do mesmo modo, têm
surgido Associações de índole empresarial que visam a defesa de interesses comuns
a certas formas de prestação de serviços médicos. Durante muito tempo alguns
sectores tiveram as suas associações, de dimensão variável, trabalhando
isoladamente. As leis do mercado conduziram já a que se formasse uma Federação
de associações de prestadores de serviços. Tornou-se evidente que a discussão
dos contratos coletivos de trabalho com os representantes dos assalariados
assim como a discussão das cláusulas das convenções não eram devidamente
asseguradas por pequenas associações. As associações criadas para a defesa de
interesses comuns a certas formas de prestação de serviços médicos têm um papel
específico na sociedade civil o qual não é, nem pode ser, contraditório com a
garantia da qualidade dos atos médicos praticados.
Cada tipo de organização pode
ter uma estrutura similar – um grupo de pessoas, uma escolha democrática dos dirigentes,
uma contribuição pecuniária sob a forma de quota, um estatuto regulador, uma
responsabilização dos eleitos perante os eleitores e perante a lei. Cada tipo
de organização pode ter até os mesmos colegas, sócios ou associados. O que as
diferencia são os objetivos diferentes na mesma organização não ajuda a fazer
consensos – ajudar a criar conflitos. E não há que temer que uma associação de
tipo empresarial possa tomar um caminho perverso só por visar interesses
económicos – a sua atividade está constantemente sob os olhares dos seus
associados e das outras organizações.
Estas reflexões surgiram a
propósito da revisão dos estatutos da Associação Portuguesa de EEG e Neurofisiologia
Clínica (uma sociedade científica) na qual se pretendia manter o obsoleto
princípio de juntar a defesa empresarial dos prestadores à promoção científica.
O projeto em discussão previa mesmo que algumas empresas se constituíssem como
sócios e tivessem assento em alguns órgãos ao mesmo tempo que os próprios
gerentes dessas empresas a título individual.
Sou de opinião que a clara
"separação das águas'' é a melhor forma de defender a qualidade. A
delimitação dos objetivos, como a delimitação dos setores (público e privado),
só pode contribuir para a adequada defesa dos interesses dos consumidores assim
como para o respeito pelos legítimos interesses dos prestadores.